Quid est Sacerdos? (O que é o Sacerdote?)


Quid est Sacerdos? Vós sereis meus amigos se fizerdes o que vos mando1.

Qual a intenção de Cristo ao instituir o sacerdócio? Dar ao homem dignidade? Sustento vitalício? Ostentação? Um emprego? Boa imagem social? Carreira musical? Não! Ao criar o sacerdócio, o Cristo quis perpetuar a sua presença humana visível no mundo, cumprindo assim a promessa em estar conosco até o fim dos tempos2. E não só isso, pois, sendo alguém que atua in persona Christi neste mundo, o sacerdote é também uma expressão tangível do amor de Deus pela humanidade que nos proporciona a experiência de sua misericórdia, através dos Sacramentos.

O homem eleito para o sacerdócio é um outro Cristo, outro Cordeiro que se dá ao sacrifício, ou seja, ele deve estar ciente e disposto a morrer para o mundo3, pelo rebanho, e a se tornar uma oferenda viva que se consome pelo povo, por Cristo, com Cristo e em Cristo. A oferenda nas mãos do sacerdote não tem direitos sobre si; ela pertence àquele a quem foi oferecida e por isso deve estar totalmente resignada à vontade do seu Senhor. 

Essa resignação se manifesta na transformação da vida e da mentalidade, já que agora o sacerdote é como a mão do Rei, sendo aquele que age em nome do Rei, que é a presença do Rei e faz – deveria fazer- somente aquilo que o seu Rei pensa e manda. Ele agora é um embaixador, que deve ser fiel e honrar a dignidade o seu emissário. Para tal, precisa ser mais do que um servo. Tem que ser amigo do Rei, pois o servo não sabe o que quer o seu senhor4, e só é amigo do Senhor quem faz o que ele diz1.

A morte do homem-oferenda para o mundo é simbolizada pelos trajes eclesiásticos convenientes5 como o hábito, a veste clerical (clergyman ou colarinho romano), pela batina etc. afinal de contas, se o grão de trigo, caído na terra, não morrer, fica só; se morrer, produz muito fruto6.

A batina preta lembra de modo mais incisivo uma mortalha, para mostrar ao mundo, de modo inquestionável, que aquele homem morreu para o presente em vista do porvir. É impossível ver um homem de batina e não pensar em Deus, ainda que seja o ateu, sabe que aquele sinal é um símbolo do sagrado. A batina é um sacramental, e como todo sacramental, incomoda a quem está nas trevas.

O sacerdote é o um elo entre o Céu e a Terra. É o canal desejado e usado pelo Senhor para manifestar-se entre nós. Vive – e deve viver- entre duas realidades: a eternidade e a brevidade. Habita no mundo, mas, Cristo é quem deve viver no seu interior7 e orientar suas ações. Ele é um ser imanente que convive e colabora com o transcendente.

Este homem-oferenda habita num paradoxo, já que, tendo consciência de sua debilidade, assume a mais alta de todas as fidalguias, para que, participando de modo ativo do sacerdócio de Cristo, e oferecendo pelo povo o mesmo e único sacrifício redentor, deve oferecer ele também sua carne e o seu sangue para a glória de Deus, para o bem do povo e de toda a Santa Igreja de Cristo.

Em síntese, o sacerdote é o coração de Jesus no mundo. É a manifestação do amor de Cristo pelo povo. Por isso, deve atender à primeira vocatio, que consiste em permanecer in sinu Iesu, ouvir o seu coração para que possa então, viver e agir per ipsum, et cum ipso, et in ipso8. O sacerdote que se afasta desse primeiro chamado, tende a perder a referência como aquele que, ao se afastar da fogueira, perde a luz e o calor; volta à imanência, esquece o sentido e por fim, pode até deixar o altar. 

O que é então o sacerdote? Um homem que, por amar a Deus e a eternidade, decide ser um instrumento nas mãos do seu Senhor.

“...o Senhor sabe trabalhar e agir também com instrumentos insuficientes9.”

                                                    Fabrício Alves da Silva 

1. Evangelho de São João 15, 14;

2. Evangelho de São Mateus 28, 20;

3. Colossenses 3, 3; 

4. Evangelho de São João 15, 15;

5. Código de Direito Canônico, Cân. 284;

6. Evangelho de São João 12, 24;

7. Gálatas 2, 20;

8. Doxologia, Missal Romano.

9. Papa Bento XVI, 2005.


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